Não percebo nada de futebol, nunca li elaboradas teses sobre o futebol, nunca tive qualquer formação sobre futebol, simplesmente adoro futebol desde muito cedo. Aos 4, 5 anos já passava dias e dias a jogar na rua...
Tenho 44 anos e continuo a adorar ver futebol, a adorar jogar futebol...
Esta minha tese resulta apenas da minha experiência, daquilo que vejo. Mas gostava de partilhar convosco:
O que faz um bom jogador de futebol? O que faz um grande jogador de futebol? O que faz um jogador de futebol fora-de-série?
Julgo que há 3 características básicas a ter em conta, a meu ver as essenciais. Depois haverá multiplos aspectos importantes, mas não tão decisivos.
Assim:
1. Talento
2. Capacidade física
3. Inteligência
Para se ser um jogador de futebol fora-de-série tem de se ter estas 3 características em fartura. E mais qualquer coisa.
Para se ser muito bom, tem de se ter as 3 características em grandes quantidades.
Para se ser bom, é preciso ter pelo menos duas destas características em elevadas doses.
Mas vamos primeiro ver cada uma das características:
1. Talento
O talento é aquilo a que comummente chamamos de habilidade, capacidade técnica. É o jogador que sabe dominar uma bola na perfeição, que sabe driblar o adversário, que sabe rematar com determinação e pontaria, que sabe meter a bola no colega de equipa com grande precisão. Basicamente, o jogador que trata a bola por tu, que faz dela aquilo que quer. Diria que nas equipas profissionais não haverá jogadores sem talento. Todos o têm, uns mais que outros, mas todos eles têm estas capacidades.
2. Capacidade física
Um jogador com muito talento mas sem capacidade física, sem ser capaz de aguentar a carga do adversário, sem ter a rapidez necessária de chegar às bolas antes do adversário, sem a energia necessária para fazer uma corrida desde a defesa até à linha de fundo... será sempre um jogador com dificuldades. A capacidade física é uma condição base para se ser bom jogador. Um jogador pesado, lento, ou demasiado frágil, sem aguentar uma carga, ou com medo de ir ao choque com o adversário... será sempre um jogador diminuído! Diria também que numa primeira divisão profissional, todos os jogadores o têm em elevadas doses.
3. Inteligência
A inteligência é talvez, de entre os 3 factores, aquele que é determinante para fazer a diferença entre um bom jogador e um grande jogador, a diferença entre um grande jogador e um jogador fora-de-série. É aquela capacidade que faz com que o Messi perceba a desmarcação de um colega e se posicione no sítio mais improvável onde vai receber a bola e surpreender todos. É aquela magia de um passe para um jogador que ninguém esperava que aparecesse sozinho num espaço vazio. É o «show» de um Zidane que com um gesto, empurra toda a equipa adversário para um lado e mete a bola no outro... É a capacidade de ler todo o jogo, ter a bola nos pés e perceber, como se tivesse visão panorâmica, que o seu colega que está atrás vai aparecer à esquerda, ou quando recebe uma bola e está de costas para a baliza e percebe que o guarda-redes está encostado a um lado e mete a bola no outro... é a capacidade de perceber o momento exacto em que passa a bola, no momento exacto em que o colega vaiu receber bem, que o adversário vai ser apanhado em contrapé... É, na minha modesta opinião, aquele factor que determina quem pode ser um grande jogador! na verdade, sem esta característica... nunca um jogador será um grande jogador!
Um atleta com estas 3 características, e a terceira a níveis muito elevados, é um jogador fora-de-série, é um Messi, um Kaka, um Cristiano Ronaldo, um Deco, um Maradona, um Eusébio...
Ou seja, pode ser-se um talento formidável, fazer coisas mágicas com a bola nos pés, mas não tendo a inteligência suficiente de perceber o momento certo de passar a bola, não tendo essa capacidade de perceber que as duas fintas iniciais foram geniais, mas a terceira pode estragar tudo, e é melhor passar a bola e recebê-la mais à frente... sem essa capacidade... será sempre um bom jogador... mas não terá aquele «clique» que faz a diferença entre os demais...
Por isso leram com certeza que elogiei várias vezes o tipo de jogo do Barcelona... uma equipa que joga com inteligência, com entre-ajuda... em cada jogo que faz o Barcelona tem sempre mais de 60, 70 % de posse de bola... uma equipa inteligente, com um jogador de talento incomparável, faz sempre bons jogos!
Não tenho grande admiração por aquelas equipas que jogam com grandes talentos, mas cada um para seu lado. Jogadores de talento muito acima da média a quererem fazer tudo sozinhos. Normalmente dá maus resultados. Já aconteceu com várias equipas de «superestrelas»...
FORMAÇÂO
Agora, quando falamos de formação, quando falamos dos nossos miúdos, temos de ter a consciência que alguns destes factores são trabalháveis, mas muito já está no gene... ou se tem ou não se tem...
A capacidade física trabalha-se... Todos sabemos que o Cristiano Ronaldo tem aquele corpo modelado porque desde os 13 anos que se habituou a fazer milhares de abdominais por dia (diz-se que 3 mil...) diariamente se habituou a fazer horas de ginásio...
Para se ser dos melhores do mundo não basta o talento e a inteligência, e o Cristiano Ronaldo percebeu isso desde pequenino! Ele disse-o nas entrevistas. Desde pequenino que sonhava que podia ser dos melhores do mundo. E construiu toda a sua vida à volta desse sonho! Era um miúdo franzino com a idade dos nossos filhos... e hoje é o que é!
Este é o factor mais simples. basta ter força de vontade e trabalhar. Trabalhar muito. Qualquer um de vós que queira ser um jogador forte fisicamente, sabe que o consegue. É preciso ter força de vontade e fazer exercício, diariamente... E vai ver que chega lá!
Simples!
Aliás, para o ano que vem vão notar uma grande diferença. Vocês vão ter 14 anos... mas vão jogar com muitas equipas em que a maioria dos miúdos têm 15. E nestas idades faz grande diferença dos 14 para os 15. Ou seja, vão jogar com grandes «bestas», miudos muito fortes fisicamente... que vão chager à bola antes de vocês, que vão fazer carga de ombro que vos atiram para o chão... vai ser duro! Vão sentir isso e vão ter de se habituar a jogar com o corpo! A encostar o ombro para não caírem...
Diria que da nossa equipa os jogadores mais preparados para esse tipo de situação são o Gonçalo, o Iúri, o Mário, o Santana... O Leo... Mas a grande maioria vai sentir a diferença... o campo é maior mas são mais jogadores e há mais contacto físico... Há mais bola pelo ar (deixa tirar a bola da minha zona!) e ganha a posse de bola quem é mais forte e vai à bola com mais certezas... a este nível a nossa equipa é muito verdinha. Muitas equipas nos Infantis já jogavam mais forte que nós! Vão sentir muito a diferença!
Contaram-me uma conversa engraçada. Só para perceberem um bocadinho como funciona a coisa nos clubes grandes. Um treinador de uma equipa de iniciados que está no Campeonato Nacional dizia que todos os anos lhe aparecem 10, 15, 20 miúdos novos a tentar a sua sorte. Bons jogadores, que vão ali ver se conseguem jogar no nacional, contra benfica, Sporting... Alguns desses jogadores são muito talentosos, boas fintas, bons pézinhos... Mas são todos corridos a sete pés... «Vai tentar a sorte noutro clube miúdo»,
acaba por dizer o treinador depois de os ver...
Então não quer jogadores talentosos? Pois! Não quer! Só quer jogadores talentosos se forem também fortes fisicamente. Só ficam os grandalhões, os musculosos e rápidos. Uns melhores, outros piores tecnicamente, mas em comum todos têm que ser muito fortes fisicamente. Parece absurdo não parece?
E como explica esse treinador esta sua opção, que tem dado resultados: «Só assim consigo ter uma equipa a jogar entre os melhores do País. Uma equipa forte fisicamente não deixa os adversários jogar, somos rápidos, fortes, conseguimos disputar os jogos». De que adianta uns «brinca-na-areia» muito habilidosos se têm dificuldade em chegar à bola antes do adversário, se são comidos com uma carga de ombro???
Bem, esta é uma filosofia... não estou a dizer que a defendo, que não defendo, mas compreendo a opção!
Percebo a ideia. Para jogar com Benfica, Sporting, Belenenses, equipas fortíssimas... tem de se ter trunfos. Este treinador aposta neste trunfo! Já que não consegue ter tantos jogadores talentosos e inteligentes como os clubes grandes, ao menos no aspecto físico consegue atenuar as diferenças...
No que respeita ao Talento, julgo que o essencial está no sangue, ou se tem ou não se tem, mas tenho a certeza que se vai ganhando capacidades com os treinos, com a vontade de melhorar, com a perseverança de fazer cada vez melhor. Vê-se de ano para ano miúdos a desenvolverem talentos que antes não lhes conhecíamos. Alguns já têm o talento, mas psicologicamente são pouco auto-confiantes e não conseguem trazer cá para fora essas capacidades. De um momento para o outro ganham esdsa auto-confiança e tornam-se jogadores fabulosos.
Diria que na nossa equipa temos muito talento. Muito mesmo. Diria que nos 17 jogadores do nosso plantel temos pelos menos uns 12 jogadores com talento acima da média. Aqui a questão é a combinação entre o talento e a inteligência... e aqui é que a porca torce o rabo, como diz o povo!
Quanto à inteligência a jogar, que me parece que também é uma capacidade inata, e aí já não há grande possibilidade de evolução, ou se nasce com ela, ou então, nada feito... Julgo que com treinadores persistentes, que corrijam até à exaustão as decisões erradas, se consegue uma melhor leitura de jogo, mas nunca se conseguirá que um jogador que não tem uma grande leitura do terreno passe a ter essa capacidade a um nível tal, que o torne naquele grande jogador, de um momento para outro!
Nós temos vários jogadores no nosso plantel que são excelentes a fazer fintas... Bons talentos, como disse atrás. São muitos com muito talento. Só que muitos deles não perceberam que o objectivo do jogo é marcar golo, e que nesse seu percurso com a bola ao longo do espaço, com a bola nos pés, há momentos em que é mais provável que se consiga o golo se se passar a bola a um colega do que se se continuar a tentar a ultrapassar adversários sozinho... É nestes momentos que entra a inteligência para o futebol. Eu espero que se consiga corrigir isto com treino, com muito treino. E corrigindo, conseguimos jogadores talentosos a jogar com alguma inteligência.
E esta inteligência funciona para os dois lados. Muitas vezes é ao contrário, o jogador que tem espaço à sua frente para entrar e está a procurar de um colega para passar. É errado. É uma má leitura do terreno. Ou entra na área e pára a bola e passa para trás. É errado. É preciso ter inteligência para se decidir bem... se entrou na área e só tem à sua frente um defesa, sem ninguém para passar, deve tentar a finta...
Daí que, como dizia um dia destes o mister Tiago, há jogadores excelentes que chegam aos melhores clubes em Iniciados, em Juvenis, mas depois ficam pelo caminho... têm tudo, as capacidades técnicas e físicas, têm o talento, mas falta-lhes a inteligência... e a partir de um certo patamar, só têm lugar esses jogadores inteligentes!
O que me parece é que nestas idades os miúdos ainda não sabem se têm essa dita «inteligência para o futebol». A sua mente está focada na componente técnica. Querem tanto evoluir a nível individual, que a inteligência está em segundo plano. Provavelmente vão descobrir se têm essa capacidade inata, ou não, agora nos iniciados.
Anónimo deixou um novo comentário
Boa Tarde,
Na minha opinião existe um factor determinante no percurso de um jogador de futebol, que é o factor psicológico.
Talento, capacidade física e inteligência, são características dependentes do nosso sistema nervoso central, o qual nos leva a tomar certas e determinadas decisões contextualizadas num determinado espaço e tempo, cujo sucesso das mesmas depende do nosso perfil psicológico, e da forma como lidamos com uma série de constrangimentos colocados pela tarefa, pelo envolvimento e pelo sujeito.
Tudo isto para dizer, que associado às características anteriormente enumeradas no post, tem de estar inevitavelmente um perfil de atleta trabalhador, tranquilo que se sacrifica em detrimento de uma série de situações de desejos inerentes aos diferentes estádios da nossa evolução cronológica e biológica, tudo por uma razão maior, desejo maior, o de se tornar profissional de futebol... como diz o grande Olímpio Bento... "O talento não é suficiente..."
Abraço
Tiago Coelho
Coordenador EFBA
JPF.
Boa Tarde,
ResponderEliminarNa minha opinião existe um factor determinante no percurso de um jogador de futebol, que é o factor psicológico.
Talento, capacidade física e inteligência, são características dependentes do nosso sistema nervoso central, o qual nos leva a tomar certas e determinadas decisões contextualizadas num determinado espaço e tempo, cujo sucesso das mesmas depende do nosso perfil psicológico, e da forma como lidamos com uma série de constrangimentos colocados pela tarefa, pelo envolvimento e pelo sujeito.
Tudo isto para dizer, que associado às características anteriormente enumeradas no post, tem de estar inevitavelmente um perfil de atleta trabalhador, tranquilo que se sacrifica em detrimento de uma série de situações de desejos inerentes aos diferentes estádios da nossa evolução cronológica e biológica, tudo por uma razão maior, desejo maior, o de se tornar profissional de futebol... como diz o grande Olímpio Bento... "O talento não é suficiente..."
Abraço
Tiago Coelho
Coordenador EFBA