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sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Uma entrevista com respostas para muitas perguntas que se fazem no futebol de formação

Encontrei esta entrevista num blog. Já tem um ano, mas o tema é bastante atual, agora que recomeçamos nova época...

Sublinhei as partes que me pareceu mais interessam a pais e jogadores (principais frequentadores deste blog) e coloquei umas notas da minha lavra... aparecem entre parentesis a negro!


Aqui vai:





Luís Proença – Entrevista a propósito de “Futebol – Começar Bem Para Chegar ao Topo”


Luís Proença, treinador especializado em futebol juvenil, lançou recentemente o livro “Futebol – Começar Bem Para ao Topo” (lançado pela Desportos & Lazer, uma divisão das Publicações Europa-América), uma obra destinada dar pistas na formação de futuros craques. O livro dirige-se essencialmente a treinadores de futebol juvenil necessitados de formação e de actualização de conhecimentos. Luís Proença falou do seu livro e das suas ideias ao Porta-Livros.



Porque sentiu necessidade de escrever e publicar este livro? Dirige-se a quem especificamente?

Mais do que uma necessidade, fui motivado pela noção adquirida ao longo destes 10 anos a exercer a actividade de treinador de que há enormes carências em Portugal no capítulo da formação e actualização dos treinadores de futebol juvenil, sobretudo daqueles que exercem esta actividade nos clubes de pequena e média dimensão, que são, como se sabe, a sua grande maioria.

A Federação Portuguesa de Futebol e as Associações não garantem uma formação regular e contínua àqueles treinadores que, por não terem formação académica na área do desporto (ainda a grande maioria), e que não têm acesso ao universo restrito e elitista dos cursos de Nível III e IV da UEFA, se vêem obrigados a actualizar-se recorrendo a material informativo estrangeiro divulgado através da Internet.

Por outro lado, escasseia a oferta bibliográfica sobre treino no futebol juvenil, quer no que respeita a monografias, quer no que concerne a publicações periódicas. O que se encontra nas livrarias são sobretudo compilações de exercícios de treino avulsos.

Ciente destas carências decidi aproveitar a experiência adquirida e as muitas horas de estudo e pesquisa que fui fazendo ao longo destes anos para escrever um livro dirigido sobretudo ao largo universo de treinadores do futebol infanto-juvenil que exerce a sua actividade nos clubes de pequena e média dimensão, para os quais pode ser um bom instrumento de trabalho.

No entanto, e apesar de ter tido a preocupação de não desvirtuar as bases científicas do treino desportivo, redigi o livro numa linguagem menos técnica, mais acessível portanto a quem não tem a referida formação em desporto, facto que alarga o universo de destinatários deste livro, que pode e deve ser lido pelos encarregados de educação dos jovens candidatos a jogadores, e até pelos próprios praticantes.



Acha que há muita gente sem preparação a dirigir jogadores infantis e que isso pode ser prejudicial para os próprios futebolistas, nomeadamente a nível físico?

Infelizmente ainda continua a haver muita gente sem qualquer qualificação a trabalhar no futebol infantil. Trata-se de um cenário que tem vindo lentamente a mudar fruto da popularização dos cursos de Desporto, havendo cada vez mais licenciados e bacharéis nesta área a quererem trabalhar no futebol, facto que vai permitindo aos pequenos e médios clubes ir paulatinamente substituindo os “carolas” que punham os miúdos aos pontapés na bola por gente que tem uma abordagem mais qualificada do treino.


O nível de exigência e responsabilidade inerente ao trabalho com jovens de tenra idade em plena fase de crescimento psicomotor é totalmente incompatível com qualquer forma de treino empírico, cujos conteúdos físicos, técnicos e tácticos não se adequem minimamente a essa realidade. Para além dos vícios de índole técnica e táctica que dificilmente são corrigíveis em patamares etários mais avançados, e que condicionam definitivamente a possibilidade de sucesso desportivo na modalidade de praticantes que até poderiam ter qualidades inatas para ir muito mais longe, há ainda o risco real de contracção de lesões físicas crónicas fruto de conteúdos de treino totalmente desadequados para as idades em que são ministrados.

(Muitos pais que só querem ganhar, ganhar... que vivem com essa obsessão,  esquecem-se muitas vezes destes pormenores, que a formação tem de ser cuidada... que não vale tudo só para se ganhar... afinal são crianças...)



E a eterna questão de conciliar estudos com a prática desportiva, tem solução?


Trata-se na minha perspectiva de um problema cultural. Sustento a total compatibilidade entre os estudos e a prática desportiva. O problema é que numa modalidade como o futebol tão endeusada neste país, em que se bebe, come e dorme futebol, há uma excessiva mediatização dos praticantes de topo, cujo estilo de vida nos entra pela casa adentro todos os dias e a toda a hora.

Criou-se a convicção errada de que uma carreira no futebol é a garantia de uma vida abastada. Muitos pais perspectivam e anseiam para os seus filhos uma vida de sucesso no futebol, pelo que, ao mínimo sinal de que há capacidade inata para praticar a modalidade, alimentam excessivas expectativas em relação aos miúdos. Essas expectativas com que nós treinadores nos deparamos todos os dias, quer da parte dos miúdos quer da parte dos pais, é gerida de forma negativa, representando na maior parte das vezes, e apesar das nossas recomendações, um desinvestimento real no percurso e no rendimento escolar, quando devia ser precisamente ao contrário.

Penso que cabe aos pais, em primeira linha, inverter este estado de coisas e restabelecer as prioridades. Primeiro a escola, depois o futebol. Há tempo para ambas as coisas sem prejuízo uma da outra.

(Uma excelente resposta do autor... acho que é isto que todos os bons treinadores tentam que pais e jogadores compreendam! É fundamental que os miúdos nunca abandonem os estudos... Infelizmente há tantos e tantos casos...  miúdos que chegam aos 30 anos... nunca chegaram ao topo, nunca ganharam para juntar o suficiente, e depois acaba-se o futebol, não têm dinheiro e não sabem fazer nada na vida...)

Como é que vemos já na alta competição tantos futebolistas que parecem mais preocupados com o êxito pessoal do que com o colectivo, esquecendo por vezes a entidade empregadora com a qual assinaram contrato de livre vontade? Tem que ver com as características de cada um ou foram mal “formatados” desde início?

A resposta à pergunta anterior esclarece um pouco a origem de uma certa mentalidade egocêntrica que existe neste meio. É óbvio que o perfil psicológico de cada jogador pode contribuir mais ou menos para o acentuar dessa faceta, mas a verdade é que o enraizar da noção de que o futebol é primeiro um negócio e depois uma modalidade veio contribuir seriamente para que se instalasse uma mentalidade mais comercial que muitas vezes relativiza o velho conceito de “amor à camisola” que caiu em desuso. É verdade que os jogadores se preocupam muitas vezes é com a perspectiva de um contrato melhor, mesmo que para tal tenham que secundarizar certos conceitos próprios de uma modalidade colectiva que exige um grande compromisso em torno de objectivos comuns para que possa haver sucesso desportivo.



Como se consegue dosear a quantidade de ensinamentos e treino específico sem minar o talento e a criatividade de cada um?

É sem dúvida uma excelente pergunta. O que é importante é fazer compreender aos jogadores mais dotados tecnicamente que devem colocar as suas capacidades inatas ao serviço do colectivo. Hoje em dia as exigências tácticas do futebol impõem que cada vez mais se valorize o rigor táctico em detrimento da mais-valia técnica individual. Para os jogadores mais dotados nesse capítulo devemos incentivá-los e criar rotinas para que usem dessa sua mais-valia no tempo e no espaço próprio no contexto organizacional do jogo. Se os habilitarmos a usar essa sua arma no momento e no sítio certo durante o jogo, instruindo-o a desempenhar outras tarefas importantes na dinâmica da forma de jogar da equipa em qualquer das fases do jogo, estamos a contribuir para o tornar ainda melhor.


Continua pois a haver espaço para a criatividade e talento mais dirigida a momentos específicos do jogo e no espaço certo do terreno de jogo.


Hoje em dia já não há espaço para aqueles jogadores que pegam na bola junto à sua baliza e tentam sistematicamente fintar todos os adversários que lhe aparecem pela frente mantendo o resto da equipa na expectativa do sucesso ou do insucesso dessa acção.

Devemos, pois, no âmbito do trabalho das rotinas inerentes à forma de jogar de cada treinador, criar os conteúdos que permitam a esses jogadores usar desse seu talento no momento e no local próprio.

(Acho que aqui é que está a chave de tudo. Os miúdos talentosos são muitas vezes incentivados a serem egoístas, para darem nas vistas, para serem vistos por olheiros, para subirem a clubes grandes... e os coitados, deixam de jogar com inteligência. São excelentes tecnicamente... mas querem fazer tudo sozinhos... azar... os grandes clubes também não querem jogadores bons tecnicamente mas sem inteligência a jogar... já lá vai o tempo dos brincas-na-areia...  Já viram como o Quaresma subiu., subiu, chegou lá acima... deslumbrou, era um grande artista... começou a pensar que o futebol era aquilo... brincar com a bola, jogador-autista isolado da equipa... pois... foi eleito o pior jogador do campeonato italiano... Viram como hoje jogou na seleção contra o Chipre? Pois... já aprendeu. Tem de jogar para a equipa! Usar os seus trunfos nos momentos certos... não é sempre... nem é quando lhe apetece... Infelizmente, neste aspeto acho que a culpa é a maior parte das vezes dos pais e de alguns treinadores. Ao incentivar um jogador que já é individualista a ser ainda mais egoísta... pensam que o estão a ajudar mas só estão a comprometer totalmente o seu futuro! Um jogador que finta muito, que faz muitas brincadeiras com a bola... mas cuja prestação não tem resultados no jogo coletivo...  não serve para nada... é preferível um jogador mais fraco tecnicamente, que passa sempre bem, ao primeiro toque e que nem sequer sabe fintar... é mais útil para a equipa! Ajuda mais a equipa a ter resultados! É esquisito não é? Mas é assim mesmo...)


Há formas de preparar um futebolista em formação para a eventualidade de poder nunca passar de um futebolista mediano, destinado a fazer carreira nos escalões secundários?

Eu diria que a única forma de o preparar para tal, é fazendo-o perceber que deve trabalhar sempre na perspectiva de chegar ao topo, pois se o fizer bem e se for persistente, mesmo que não tenha a sorte de lá chegar, poderá pelo menos um dia beneficiar da possibilidade de aliar o rendimento do seu trabalho fora do futebol ao rendimento extra que pode auferir no fim do mês fazendo uma coisa que adora: jogar futebol, mesmo que seja num clube de dimensão distrital. E essa só por si já deve ser uma motivação extra para que se entregue ao máximo mesmo que antecipe que tem poucas hipóteses de ser um dia um futebolista profissional.



Como se deve lidar com os pais ou familiares, às vezes tão ávidos de terem um craque na família?

Podia dizer que uma atitude pedagógica dos treinadores perante esses pais poderia contribuir para atenuar essa dose excessiva de expectativas. Contudo, infelizmente, a experiência diz-me que há muitos pais que nem sequer querem ouvir uma recomendação no sentido de não criarem doses excessivas de expectativas em relação aos seus filhos. Na maior parte dos casos esses pais associam essa posição do treinador a má vontade ou perseguição aos seus filhos em detrimento de outras crianças. A avidez provoca a cegueira…

(às vezes é tanta a avidez, a vontade de que os filhos tenham sucesso... que nós pais nos tornamos cegos e não vemos o óbvio...  tenho-o escrito aqui com frequência... não pressionem os miudos, não chateiem os treinadores... deixem-nos divertirem-se... quando os miúdos não se divertirem...  aí deve deixar-se a decisão a eles próprios! Mudem de desporto! Não vale a pena é atirar  a culpa do insucesso dos filhos para os treinadores... é uma receita já tão estafada que não há paciência...  EU, confesso, já não consigo ouvir esse discurso...)

Como se motiva miúdos que chegando a clubes organizados e federados deixam de jogar só pelo prazer de jogar e passam a ter de respeitar horários, calendários, estratégias e treinos colectivos, e que, eventualmente, são desviados para posições em campo que não eram as que mais lhe agradavam?

Antes de mais cumpre-me esclarecer que quando falo nos clubes de pequena e média dimensão me estou a referir obviamente a clubes federados. Hoje em dia, praticamente todos os clubes que têm pré-escolas, escolas e departamentos de futebol infantil e juvenil são federados, pelo que estão adstritos à calendarização oficial das competições das respectivas associações ou federação, havendo já muitos que têm regulamentos internos que impõem algum rigor à prática desportiva em termos de cumprimento de horários, assiduidade aos treinos e disciplina.

Na verdade, e por todos os clubes por onde passei, os jovens que não quiseram cumprir com as regras internas, formais ou informais, em termos de horários, assiduidade e disciplina acabaram afastados desses clubes, pelo que, e como eu costumo dizer, só lá está quem quer e está preparado para aceitar essa realidade. Caso contrário, é melhor limitar-se ao futebol de rua. Tal não impede que joguem e treinem com prazer.

Questão diferente é a utilização dos jogadores fora das posições que mais lhe agradam.

Antes de responder a esta questão, adianto que reconheço importância, sobretudo nos escalões de pré-competição (escolinhas, escolas) e até nos infantis, de proporcionar aos jogadores experiência e rotinas em posições diferentes. Sobre este assunto, que está muitas vezes na origem de focos de conflituosidade entre treinadores e jovens jogadores, deve prevalecer em primeiro lugar a noção de que o treinador está habilitado a perceber em que posição ou posições é que determinado jogador, em função das suas características, pode atingir níveis adequados de rendimento individual e colectivo.

Por outro lado, deve explicar-se ao jogador que o facto de ser utilizado pontual ou mais sistematicamente fora da posição que mais lhe agrada o pode enriquecer enormemente em termos tácticos e capacidade de perceber a organização dinâmica do jogo em si. Fica com uma noção mais abrangente do jogo e ganha outras competências que o podem até valorizar no futuro quando chegar ao futebol sénior, contexto onde muitas vezes a versatilidade táctica de um jogador lhe abre as portas para jogar em plantéis em que a sua posição de preferência está normalmente ocupadas por jogadores mais experientes. Claro que num contexto em que chamamos um jovem jogador para treinar e competir numa posição em que não está rotinado devemos apoiá-lo municiando-o com advertências técnicas e tácticas que lhe permitam enfrentar a tarefa com hipóteses de sucesso, o que a acontecer vai não só aumentar a sua confiança como a sua disponibilidade para repetir a experiência no futuro.


(Eu tenho um exemplo em casa. O meu filho começou a jogar como defesa central. E porquê?... Não sei... acho que lá no Charneca faltava ali um jogador naquele lugar... e experimentaram... pelos vistos gostaram!  Jogou ali três épocas... sempre a jogar no escalão acima... fez excelentes jogos! Chegou ao Almada e o Mister disse-me de caras depois de 3 ou 4 treinos: «O quê? Adefesa central? Nem pensar... tem características de médio, é ali que o vou meter a jogar...»  hoje já nem o consigo imaginar à defesa...  mas nem sei. Imaginem que os novos treinadores descobrem que pode ser um excelente lateral? Ou procuram adaptá-lo a outro lugar porque a equipa tem outros melhores que ele no lugar? É mesmo assim... é deixar correr! 


JPF.

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